Mais de 200 trabalhadores que enfrentavam condições de trabalho análogas à da escravidão em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, foram resgatados na noite da última quarta-feira (22), em uma ação conjunta entre a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a Polícia Federal (PF), o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) do Rio Grande do Sul.
A maioria dos trabalhadores era da Bahia. O resgate ocorreu após três trabalhadores fugirem do local e denunciarem a situação à PRF em Caxias do Sul (a cerca de 40 km de Bento Gonçalves). Eles dizem ter sido atraídos pela promessa de um salário de R$ 3 mil, mas relataram enfrentar atrasos nos pagamentos dos salários, violência física, longas jornadas de trabalho e oferta de alimentos estragados.
A denúncia envolve uma empresa que prestava serviços para três grandes vinícolas brasileiras: a Aurora, a Garibaldi e a Salton. Em notas distintas, as empresas afirmaram que a Oliveira & Santana é uma empresa terceirizada, contratada para suprir a demanda “pontual e específica do descarregamento de caminhões no período da safra da uva”, e que desconheciam as condições dos trabalhadores resgatados.
As vinícolas, que estão entre as principais da Serra Gaúcha (e do Brasil), dizem também que estão trabalhando em conjunto com as autoridades e que não compactuam com as condições fornecidas aos funcionários. A Aurora afirmou ainda que “pagava à Oliveira & Santana um valor acima de R$ 6,5 mil/mês por trabalhador, acrescidos de eventuais horas extras prestadas” (veja mais abaixo).
O MPT do Rio Grande do Sul diz que os trabalhadores já receberam parte das suas verbas rescisórias e que, com exceção de 12 pessoas, todos já retornaram para os seus respectivos estados de origem.
Uma pessoa foi detida até o momento: o empresário Pedro Augusto Oliveira de Santana, responsável por recrutar e manter os trabalhadores. Mas ele pagou fiança de R$ 40 mil e agora responde ao processo em liberdade, segundo a TV Globo.
Veja abaixo um perguntas e respostas sobre o caso:
Quantos trabalhadores foram resgatados?
Duzentos e sete trabalhadores foram resgatados em condições análogas à escravidão em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha. Os resgatados tinha, entre 18 e 57 anos, a maioria era da Bahia e eles estavam em uma pousada na Rua Fortunato João Rizzardo, no bairro Borgo, em Bento Gonçalves (RS).
Quem fez a operação na Serra Gaúcha?
Foi uma ação conjunta entre a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a Polícia Federal (PF), o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) do Rio Grande do Sul. A operação foi realizada na noite da última quarta-feira (22).
Quem fez a denúncia?
O resgate ocorreu após três trabalhadores fugirem do local e denunciarem a situação à PRF em Caxias do Sul (a cerca de 40 km de Bento Gonçalves). Eles dizem ter sido atraídos pela promessa de um salário de R$ 3 mil, mas relataram enfrentar atrasos nos pagamentos dos salários, violência física, longas jornadas de trabalho e oferta de alimentos estragados.
Alguém foi preso?
Uma pessoa foi detida até o momento: o empresário Pedro Augusto Oliveira de Santana, responsável por recrutar e manter os trabalhadores. Mas ele pagou fiança de R$ 40 mil e agora responde ao processo em liberdade, segundo a TV Globo.
A que os trabalhadores eram submetidos?
Os trabalhadores disseram ter enfrentado atrasos nos pagamentos dos salários, além de violência física, longas jornadas de trabalho e oferta de comida imprópria para consumo (alimentos estragados). Eles relataram ainda que, desde que chegaram à cidade, no início de fevereiro, eram coagidos a permanecer no local, sob pena de pagar multa por quebra do contrato de trabalho.
Eles também disseram que só podiam comprar produtos em um único estabelecimento, com preços elevados e descontados no salário, e eram mantidos vinculados ao trabalho por supostas “dívidas” contraídas com o empregador.
Segundo os depoimentos colhidos após a operação, as promessas feitas no momento da contratação incluíam a de que seriam custeados alimentação, hospedagem e transporte. “Mas, chegando ao Rio Grande do Sul, os trabalhadores tiveram que pagar pelo alojamento, já começando em dívida. O local de alojamento também apresentava péssimas condições”, afirma o MPT-RS.
“Além disso, também constatou a concessão de empréstimos a juros extorsivos pelo dono do alojamento ligado ao empregador, assim como os descontos feitos pelos produtos adquiridos em mercado próximo ao alojamento”, detalharam auditores ligados ao Ministério do Trabalho e Emprego. “Os relatos de violência física e psicológica ocorridos no mesmo alojamento foram o diferencial neste procedimento fiscal”.
Os trabalhadores foram torturados?
A Corregedoria da Brigada Militar do Rio Grande do Sul (a PM gaúcha) investiga se policiais militares coagiram e torturaram os trabalhadores, segundo o Jornal Nacional. O governador Eduardo Leite (PSDB) anunciou a criação de uma força-tarefa sobre o caso (veja mais abaixo).
O que aconteceu com os resgatados?
O MPT-RS diz que os trabalhadores receberam “parte das suas verbas rescisórias” e que, com exceção de 12 pessoas, todos retornaram para os seus respectivos estados de origem. Eles viajaram em quatro ônibus fretados, com garantia de custeio da alimentação durante o trajeto.
Segundo o MPT, cada trabalhador recebeu R$ 500, como adiantamento das verbas rescisórias que serão pagas aos resgatados, e o cálculo total das verbas rescisórias deve ultrapassar R$ 1 milhão. O pagamento será feito pela empresa que os contratou. O dono da empresa se comprometeu a pagar todas as dívidas até terça-feira (28), por meio de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC).
“Está estabelecido no TAC que o empresário deverá apresentar a comprovação dos pagamentos sob pena de ajuizamento de uma ação civil pública por danos morais coletivos, além de multa correspondente a 30% do valor devido”, afirma o MP.
E a Justiça do Trabalho?
O MPT diz ainda que os valores que serão pagos pela empresa “não quitam os contratos de trabalho, nem importam em renúncia de direitos individuais trabalhistas, que poderão ser reclamados pelos trabalhadores” (ou seja, as vítimas poderão processar o empregador na Justiça do Trabalho.
Segundo o órgão, será marcada nesta semana “audiência com a empresa empregadora e com as vinícolas tomadoras para prosseguimento da negociação de indenizações individuais e coletiva e também para fixação de obrigações que previnam novas ocorrências”.
O que diz o governo federal?
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, afirmou na segunda-feira (27) que “certamente não se trata de um caso isolado, sabendo como se dão as relações de trabalho em nosso país”.
“Diante das graves denúncias dos últimos dias, solicitei a imediata convocação de uma reunião extraordinária da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, a Conatrae, para que nós articulemos as ações que possam e que deverão ser tomadas”, afirmou Almeida em Genebra, na Suíça, onde participa da 52ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Já a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) suspendeu a participação das vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton das iniciativas que apoia. A participação em feiras internacionais e missões comerciais não ocorrerá “até que as investigações das autoridades competentes sejam concluídas”.
A Apex é vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), que promove os produtos brasileiros no exterior. O ministro responsável pela pasta é o vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB).
O que diz o governo estadual?
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), criou um grupo de trabalho, envolvendo as secretarias do estado, “para acompanhar as ações já articuladas e para tratar de outras medidas emergenciais”.
Sobre a denúncia de que policiais militares podem ter coagido e torturarado os trabalhadores, o secretário da Segurança Pública do estado, Sandro Caron, afirmou que a Corregedoria da Brigada Militar se reuniu com o delegado federal que preside as investigações em Caxias do Sul.
Segundo o secretário, a Corregedoria “se colocou à disposição na apuração e solicitou o compartilhamento de provas para que, caso se confirme o envolvimento de policiais militares, possa ser feita a apuração disciplinar e de eventual crime penal e militar”. “Não compactuamos com o desvio e, se confirmada a situação, será dada punição exemplar, firme e dentro da lei”.
O que dizem as vinícolas?
Em nota, as vinícolas disseram que desconheciam as irregularidades praticadas contra os trabalhadores e culparam a empresa terceirizada. Veja abaixo os posicionamentos completos:
“Em respeito aos seus associados, colaboradores, clientes, imprensa e parceiros, a Vinícola Aurora vem a público para reforçar que não compactua com qualquer espécie de atividade considerada, legalmente, como análoga à escravidão e se solidariza com os trabalhadores contratados pela terceirizada Oliveira & Santana.
As vítimas são funcionários da Oliveira & Santana, empresa que prestava serviços às vinícolas, produtores rurais e frigoríficos da região.
A Aurora já se colocou à disposição das autoridades para quaisquer esclarecimentos e está prestando apoio às vítimas. A companhia também está trabalhando em conjunto com o Ministério Público Federal e com o Ministério do Trabalho para equalizar a situação em busca de reparo aos trabalhadores da Oliveira & Santana.
A vinícola está tomando as medidas cabíveis e reitera seu compromisso com todos os direitos humanos e trabalhistas, assim como sempre fez em seus 92 anos. Ratifica ainda que permanece cumprindo com suas obrigações legais e com a sua responsabilidade também perante ao valor rescisório a cada trabalhador contratado pela Oliveira & Santana.
A Aurora conta com 540 funcionários, todos devidamente registrados e obedecendo a legislação trabalhista. Porém, na safra da uva, dentro de um período de cerca de 60 dias, entre janeiro e março, a empresa depende de um grande número de trabalhadores, se fazendo necessária a contração temporária para o setor de carga e descarga da fruta, devido à escassez de mão de obra na região.
Quanto à empresa terceirizada, cabe esclarecer que a Aurora pagava à Oliveira & Santana um valor acima de R$ 6,5 mil/mês por trabalhador, acrescidos de eventuais horas extras prestadas. A terceirizada era a responsável pelo pagamento e pelos devidos descontos tributários instituídos em lei. A Aurora também exigia os contratos de trabalhos da equipe que era alocada na empresa.
Todo e qualquer prestador de serviço da Aurora, da mesma forma que os funcionários, recebe alimentação de qualidade durante o turno de trabalho, como café da manhã, almoço e janta, sem distinções.
A vinícola também oferecia condições dignas de trabalho no horário de expediente e os gestores responsáveis desconheciam a moradia desumana em que os safristas eram acomodados pela Oliveira & Santana após o período de trabalho.
Por fim, ratificando seu compromisso social, a Aurora se compromete em reforçar sua política de contratações e revisar os procedimentos quanto à terceiros para que casos isolados como este nunca mais voltem a acontecer.”
“Carta aberta à comunidade, parceiros e clientes da Cooperativa Vinícola Garibaldi
A Cooperativa Vinícola Garibaldi protagoniza uma história de 92 anos de atuação, credibilidade e compromisso com a valorização das pessoas. Esse ideal está intrínseco no propósito cooperativista que deu origem ao negócio e, principalmente, segue norteando diariamente todas as práticas da Cooperativa Vinícola Garibaldi, inclusive na sua relação com os mais de 450 associados, pequenos produtores de agricultura familiar, e dos mais de 200 colaboradores diretos.
Alinhada com esses valores, a Cooperativa Vinícola Garibaldi repudia qualquer prática que afronte o respeito ao ser humano ou comprometa sua integridade. Isso está explicitado em seu Código de Cultura, que contempla, ainda, um canal de ética (para denúncias), disponível em vários meios de comunicação da Cooperativa e amplamente divulgado entre as partes interessadas. Encontrado também no site.
Com surpresa e indignação, a vinícola recebeu as denúncias de práticas análogas à escravidão exercidas por uma empresa terceirizada, contratada para suprir a demanda pontual e específica do descarregamento de caminhões no período da safra da uva. Prontamente, a Cooperativa Vinícola Garibaldi encerrou o contrato de prestação de serviço e colocou-se integralmente à disposição das autoridades competentes para colaborar de todas as formas com as investigações necessárias. Assim pretende seguir até a completa elucidação dos fatos, confiando no exercício da justiça e no respeito à responsabilidade social.
Da mesma forma, presta solidariedade aos vitimados pelo ocorrido e a seus familiares, reiterando que de forma alguma compactua com as práticas denunciadas e jamais aceitará tais conduções em suas relações de trabalho.
Importante salientar que, nesses menos de 30 dias de contrato prestando serviço na Cooperativa, o tratamento foi igualitário aos funcionários diretos, atendendo a todas as normas de convívio valorizadas pela Garibaldi, dentre as quais os horários, treinamento, segurança, refeições, etc., além do atendimento a todas as questões legais pertinentes.
Com a transparência que sempre conduziu suas relações, a Cooperativa Vinícola Garibaldi permanece à disposição da sociedade e das autoridades envolvidas no caso.
Divulgou nota oficial pelo Instagram: https://www.instagram.com/p/CpDv0ZYpM1p/
(Com informações da Agência Brasil e do MPT)
Fonte:
Lucas Sampaio
InfoMoney