Muito se tem falado sobre diversidade, equidade e inclusão como temas conectados à agenda ESG, mas falta compreensão e sobra confusão sobre essa conexão. Sabemos que a agenda ESG no Brasil e no mundo emplacou nos últimos anos sendo puxada pela Europa e Estados Unidos, contudo, apesar dos esforços das grandes companhias, nossa realidade ainda é muito distante no que tange às boas práticas ambientais, sociais e de governança.
Existem duas formas de mensurar essa distância. A primeira é pelas métricas convencionais com taxonomias, relatórios, monitoramento de aderência e capacitações. A segunda forma é mais intangível e deve ser observada a partir da conexão entre as métricas e a realidade nacional, especialmente no que diz respeito à conexão entre meio ambiente, governança e a diversidade nos espaços de tomada de decisão.
A questão do clima voltada a carbono e biodiversidade domina a agenda ESG, sendo chamada de viés carbonocêntrico. Isso ocorre quando a gestão, neutralização e mitigação dos gases do efeito estufa têm maior relevância ou materialidade do que outros temas. A discussão climática segue sendo importada, com reflexões e métricas pautadas nas exigências dos países desenvolvidos, colocando em segundo plano ou ignorando as profundas desigualdades sociais no nosso país.
O S do ESG diz respeito ao impacto que a organização tem no lugar onde está localizada, que inclui seus funcionários, fornecedores, comunidade vizinha e sociedade em geral. Quando incluímos, como imperativo moral de equidade, a agenda da diversidade e inclusão, o tema contempla a inserção, participação e desenvolvimento de grupos antes minorizados nos espaços de poder, entretanto não vemos essa agenda com a mesma relevância. Parte do próprio conceito de sustentabilidade (que contempla o social, ambiental e econômico) diz que ela somente é atingida quando o seu tripé é alcançado, embora venda-se a imagem de que algo sustentável seja apenas "verde", um desvio intencional de seu significado básico.
Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que foram definidos nos mesmos eventos que discutem metas climáticas, a Conferência das Partes (COP), contemplam uma abordagem mais ampla ao falar de sustentabilidade, uma vez que os ODS 5 (Igualdade de Gênero) e ODS 10 (Redução das Desigualdades) tratam diretamente de progressos sociais. Ou seja, uma empresa, independentemente do seu setor, do financeiro ao agropecuário, pode e deve se preocupar com diversidade, equidade e inclusão conectada às métricas e valores de ESG, pois ela está alinhada com referências globais de sustentabilidade, sendo um tema material independentemente do tipo de atividade econômica exercida.
Não podemos nos contentar em primeiro ser Net Zero, com seus devidos reconhecimentos formais, para depois nos preocuparmos em garantir a equidade racial em nossa cultura institucional, por exemplo. Isso não faz sentido na realidade brasileira e os projetos das áreas de ESG das grandes companhias geralmente apontam para essa realidade.
As principais rodas de discussão sobre ESG no Brasil atualmente ainda estão dominadas por pessoas brancas e da elite social brasileira. Enquanto as demais, que são as mais afetadas diretamente pela desigualdade e desastres naturais, estão excluídas de participação relevante nos debates apesar da melhor capacidade de análise da realidade social e da comprovada capacidade de gestão de recursos. Os temas de diversidade, equidade e inclusão se conectam com ESG para trazer uma perspectiva de quem vive os territórios periféricos no Brasil. Isso é tropicalizar a agenda ESG ainda com sotaque europeu em nossas terras.
*ELIEZER LEAL - Sócio-fundador da Singuê. É formado em sistemas da informação pela Universidade Estácio de Sá
*CARLOS EDUARDO MARQUES - Cientista ambiental, idealizador e diretor-geral da Ambiafro, LinkedIn Creator e Top Voice Sustentabilidade 2022, Young Leader 2022 e analista ESG na Nint
Fonte:
ELIEZER LEAL
CARLOS EDUARDO MARQUES
Correio Braziliense